TAMPO TORISFÉRICO – FEA ou Analítico?

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Introdução

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Os vasos de pressão podem ser definidos como todo recipiente com a finalidade de armazenar fluido sob pressão diferente da atmosférica. Podemos dividir esse equipamento em basicamente 4 partes:

  • Costado
  • Tampos
  • Bocais
  • Base

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Figura 1 - Partes de um vaso de pressão.

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A análise de elementos finitos é amplamente utilizada na validação estrutural deste tipo de equipamento. ASME VIII é uma das principais normas para projeto de fabricação e inspeção, sendo muito utilizada no Brasil. Ela é dividida em 3 partes, denominadas divisões.

São elas:

  • Divisão 1
  • Divisão 2
  • Divisão 3

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Explicando de maneira sucinta, a Divisão 1 adota o método analítico como base para projetos de vasos, já as divisões 2 e 3 além de analiticamente possibilitam a análise através do método de elementos finitos, as duas basicamente utilizam o método de von-Mises, no entanto, a divisão 3 é mais rigorosa que a 2 e sua utilização de materiais é mais restrita. Além disso, a divisão 3 é normalmente utilizada em vasos que operam com pressões elevadas (excedentes a 689,65bar).

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Estudo de caso (Tampo torisférico)

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Normalmente a validação através do método analítico da divisão 1 é, de certa forma, mais conservadora que a divisão 2, utilizando o método de elementos finitos. Contudo, essa regra não se aplica para alguns tampos do tipo torisférico, para eles, o FEA é mais conservador que validar analiticamente.

Tampo torisférico

Figura 2 - Tampo torisférico.

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Neste artigo será efetuada a análise do tampo torisférico de um vaso, com pressão inferior a 689,65bar. Dessa maneira, utilizaremos apenas as divisões 1 e 2 da ASME VIII.

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O intuito aqui não é ensinar o passo a passo da simulação de um vaso (para isso consulte nosso artigo: FEA - VASO DE PRESSÃO) mas sim de mostrar a diferença entre simular um tampo torisférico e calculá-lo de forma analítica.

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As características geométricas dos tampos são importantes e devem ser levadas em consideração tanto no cálculo analítico quanto na análise de elementos finitos. Vale lembrar que os tampos não necessariamente precisam seguir este padrão do tipo torisférico, existem diversas geometrias utilizadas para essa finalidade. Abaixo são mostradas algumas geometrias adotadas em tampos de vasos de pressão.

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Figura 3 - Geometrias adotadas para tampos.

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A imagem abaixo mostra as dimensões importante em tampos torisféricos.

Características geométricas de tampo torisférico

Figura 4 - Características geométricas de tampos torisféricos.

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Onde:

D – Diâmetro interno do vaso

L – Raio da coroa

r – Raio do rebordo

h – Altura da parte reta

t – Espessura do tampo

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Os tampos torisféricos denominados de 6% e 10% são bem populares no Brasil. Esses tampos possuem o raio do rebordo sendo relativo a 6 ou 10% respectivamente do raio da coroa.

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Para o desenvolvimento deste artigo, foi considerando um tampo torisférico 6%, com as dimensões apresentadas abaixo:

  • Geometria (ASME 6%)


  • Material

As divisões da ASME apresentam diferentes valores de tensão admissíveis para um mesmo material, a tabela abaixo mostra as tensões admissíveis nas divisões 1 e 2 para o material utilizado nesse artigo (SA 240 TP304 – 110°C):

Tensões admissíveis para este tampo

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Vale ressaltar que as tensões admissíveis são obtidas em diferentes tabelas. As tensões admissíveis utilizadas na divisão 1 provém da tabela 1A da ASME II – Part D, já as tensões utilizadas na divisão 2 são encontradas na tabela 5A da mesma ASME II – Part D.

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Verificação de tampo torisférico de acordo com a ASME VIII Div 1:

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O cálculo de tampos torisféricos de acordo com a ASME VIII Div 1 deve seguir as diretrizes contidas no UG32 (d) Torispherical Heads. A validação do tampo torisférico é feita baseada em 02 metodologias de cálculo, o que diferencia elas são a relação ts/L

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Relação ts/L>0,002 para tampo torisférico

Utilizar as diretrizes (d) Torispherical Heads

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Relação ts/L> 0,0005 e ts/L<0,002 para tampo torisférico

Utilizar as diretrizes (f) Torispherical Heads With ts/L < 0,002

 

Segundo a ASME VIII Div 1, se o tampo analisado apresentar uma relação ts/L que se encaixa na segunda metodologia ambas devem ser atendidas, ou seja, se um tampo possuir relação ts/L entre 0,0005 e 0,002 tanto as diretrizes (d) quanto (f) da UG32 devem ser atendidas.

Caso a relação ts/L for menor que 0,0005 somente uma análise de tensões pode ser aplicada.

Para o tampo em questão, temos:

Cálculo da relação ts/L para o tampo do artigo

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Como mostra a equação acima a relação apresenta um resultado menor que 0,002 e maior que 0,0005, portanto as duas metodologias devem ser aplicadas. Porém para não estender o artigo mostraremos apenas o resultado mais crítico, ou seja, aquele que exige uma menor pressão de trabalho.  A tabela abaixo mostra os resultados de espessura mínima e pressão máxima admissível para as características desse tampo.

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Planilha de cálculo de tampo torisférico pela Div1 das ASME VIII

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Verificação de tampo torisférico de acordo com a ASME VIII Div 2:

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Para a verificação de acordo com a ASME VIII Div 2, foi utilizado o método dos elementos finitos, sendo considerada a geometria abaixo:

Geometria em SpaceClaim do tampo utilizada no FEA

Figura 5 - Geometria utilizada no FEA.

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O material aplicado a geometria é mostrado abaixo:

Detalhe do material aplicado ao tampo

Figura 6 - Material aplicado ao modelo.

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A região de fixação e aplicação da pressão na geometria é destacada abaixo:

Detalhe da região de aplicação da pressão no tampo

Figura 7 - Detalhe da região de aplicação da pressão.

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Detalhe da fixação do vaso de pressão

Figura 8 - Detalhe da região de fixação do vaso.

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A malha considerada na análise de elementos finitos:

Tabela com os detalhes da malha

Vista isométrica da malha do tampo torisférico

Figura 9 - Vista isométrica da malha do tampo torisférico.

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Vistas frontal e inferior da malha do tampo torisférico

Figura 10 - Detalhe da malha do tampo - vista frontal e inferior respectivamente.

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Análise de tensão de acordo com a ASME VIII Div 2 é realizada considerando as tensões primárias, secundarias e pico. Para maiores informações de análise de tensão, acesse nosso artigo ANÁLISE DE TENSÕES ASME VIII - DIV 2

Os resultados de tensão são mostrados abaixo:

Vista geral das tensões de membrana do tampo torisférico

Figura 11 - Vista geral das tensões de membrana no tampo.

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Vista ISO das tensões de membrana generalizada e localizada do tampo torisférico

Figura 12 - Vistas ISO das tensões de membrana generalizada e localizada respectivamente.

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Como pode ser visto, o tampo em questão é reprovado no critério de tensão de membrana localizada.

Ou seja, aplicando a pressão de 0,88bar (que foi aprovada na Div 1), o tampo torisférico é reprovado na análise de tensões considerando as diretrizes da Div 2.

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Porque existe a divergência de resultados entre a Div 1 e Div 2?

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Os cálculos de tensão atuante da Divisão 1 foram criados a partir de testes físicos e experiências da norma durante os seus mais de 100 anos de existência.

Dessa maneira, podemos assegurar que os resultados da Divisão 1 são confiáveis e podemos seguir essa diretriz.

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A partir de diversas iterações que realizamos, percebemos que as maiores divergências entre a Divisão 1 e 2 ocorrem quando o raio do rebordo e a relação entre ts/L tendem a valores menores. Ou seja, tampos torisféricos 6% e relações de ts/L menores que 0,002 apresentam maiores divergências entre as metodologias do que tampos torisféricos 10% com relação de ts/L igual ou maiores a 0,002.

Essa divergência ocorre pela descontinuidade que existe na região de intersecção do rebordo com suas partes adjacentes na análise de elementos finitos:

Detalhe da descontinuidade presente em tampo torisférico devido ao raio de rebordo

Figura 13 - Região do rebordo - Detalhe da descontinuidade.

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O resultado de deslocamento amplificado dessa região pode ser visto abaixo:

Deslocamento do tampo torisférico - amplificado em 89x

Figura 14 - Deslocamento do tampo - amplificado 89x.

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Percebe-se que devido a descontinuidade entre os raios do tampo, ocorre uma distorção em seu deslocamento, onde, devido à pressão, a região da coroa desloca-se para fora, como esperado, contudo, a região do rebordo sofre esforços de compressão.

Vista geral dos vetores principais do tampo torisférico

Figura 15 - Vetores principais do tampo torisférico.

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Detalhe da zona de compressão na região do rebordo em tampo torisférico

Figura 16 - Detalhe das tensões de compressão na região do rebordo.

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Segue um comparativo entre o deslocamento dos tampos torisféricos com raio de rebordo relativo a 6% e 10% respectivamente, considerando o mesmo fator de amplificação de deslocamento:

Comparativo de deslocamento para tampo torisférico com raio de rebordo de 6% e 10%

Figura 19 - Comparativo entre os ângulos devido ao deslocamento - amplificado 89x.

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Perceba que o tampo de 6% possui um ângulo mais fechado quando comparado com o tampo ASME 10%, essa diferença entre o ângulo prova que a descontinuidade é mais severa em tampos com raios de rebordo menores, ou seja, para eles o esforço de compressão é maior.

Na figura abaixo, segue a comparação de deslocamento entre os tampos com ts/L < 0,002 e ts/L > 0,002 respectivamente:

Comparativo de deslocamento de tampo torisférico com diferentes relações entre ts/L

Figura 22 - Comparativo dos deslocamentos quando a relação entre ts/L >0,002.

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Da mesma maneira que na comparação feita acima entre os tampos torisféricos com raio de rebordo relativo a ASME 6% é nítida a diferença entre os ângulos devido ao deslocamento, mesmo que a única diferença entre eles seja a espessura. E como já explicado quanto mais fechado for o ângulo maior o esforço de compressão na região do rebordo.

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Portanto, fica claro que a divergência entre o método analítico abordado na ASME VIII Div. 1 e o método de elementos finitos baseado na Div. 2 ocorre em alguns casos de tampos torisféricos, principalmente pela descontinuidade do raio do rebordo. A partir das informações retiradas desse estudo, é possível que o responsável pela validação do tampo conclua qual método é o mais adequado para o cálculo estrutural do vaso de pressão.

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A análise de elementos finitos é amplamente utilizada na validação de vasos de pressão, e a ASME, que é uma das principais normas americanas que “legislam” esse tipo de equipamento, possui vários requisitos para a análise de tensões.

O objetivo deste artigo é resumir os conceitos de análise de tensão explicados no capítulo 5 da norma, bem como esclarecer algumas características do ponto de vista prático de modo a auxiliar o analista a tomar decisões para enquadrar as tensões atuantes e compará-las com os limites estipuladas para cada categoria.

A verificação das tensões de Von Mises em análises lineares de acordo com a ASME VIII Div 2 deve ser separada em categorias denominadas de primária, secundária e pico, sendo definido um limite de tensão para cada uma delas.

Antes de entrar no detalhe das categorias, é necessário entender os tipos de tensão que são considerados:

  • Tensão de Membrana – componente da tensão normal que possui o mesmo valor na espessura da seção considerada. Exemplo:

Figura 1 - Exemplo da tensão de membrana.

  • Tensão de Flexão – componente da tensão normal que varia ao longo da espessura, podendo ser de forma linear ou não. Exemplo:

Figura 2 - Exemplo da tensão de flexão.

Os tipos de tensão possuem limites admissíveis diferentes, e por este motivo é necessário separá-los no momento da análise das tensões no software de elementos finitos.

  • Ao utilizar elementos “shell”, as tensões podem ser diretamente separadas, utilizando a definição “middle” ou “Top/Bottom”.
  • Ao utilizar elementos sólidos, deve-se realizar a linearização de tensão, em que a maioria dos softwares possuem ferramentas especificas para realizar essa atividade.

Se você entender o conceito de cada categoria, fica muito mais fácil de realizar os julgamentos necessários e determinar se o equipamento está reprovado ou não.

Voltando a explicação sobre categorias de tensão, temos:

Tensões Primárias:

São desenvolvidas por uma carga capaz de satisfazer as leis de equilíbrio de forças e momentos atuantes no vaso de pressão. Caso as tensões primárias excedam o limite de escoamento do material, o equipamento sofrerá falha ou pelo menos grandes distorções. Esse tipo de tensão deve ser associado com tensões homogêneas no vaso de pressão capaz de equilibrar as forças e momentos atuantes no equipamento.

As tensões primárias devem ser analisadas de acordo com as verificações abaixo:

  • Tensão de Membrana Generalizada – existentes em locais longe de descontinuidades e concentrações de tensão, ocasionadas por forças mecânicas.
  • Tensão de Membrana Localizada – existentes próximos a descontinuidades, ocasionadas por forças mecânicas.
  • Tensão de Flexão – existentes em locais longe de descontinuidades e concentrações de tensão, ocasionadas por forças mecânicas.

Diante dessa explicação, é necessário entender o conceito de descontinuidade e concentração de tensão:

  • Descontinuidades – Definido pela norma como “Gross structural discontinuity”, é uma fonte de intensificação tensão ou deformação que afeta uma proporção considerável da estrutura, e possui um impacto significativo na distribuição de tensão ou deformação da estrutura como um todo. Alguns exemplos abaixo:
    • União entre costado e tampo:

Figura 3 - Descontinuidade entre costado e tampo.

  • União entre flanges e costado:

Figura 4 - Descontinuidade entre flange e costado.

  • Bocais:

Figura 5 - Descontinuidade entre o bocal e costado.

  • União entre costados de diferentes diâmetros ou espessuras:

Figura 6 - Descontinuidade entre costados de diferentes diâmetros.

  • Concentração de Tensão – Definido pela norma como “Local structural discontinuity” é uma fonte de intensificação de tensão ou deformação que afeta uma pequena região da estrutura e não possui um impacto significativo na distribuição de tensão ou deformação da estrutura como um todo. Alguns exemplos são raios pequenos de filete, pequenos anexos, e soldas com penetração parcial.

Algumas plotagens com exemplos de tensão primária são mostradas abaixo:

Tensão de Membrana Generalizada – o foco está nas regiões longe de descontinuidades e concentradores de tensão. Tensões devido a forças mecânicas.

Figura 7 - Probe nas regiões de tensão de membrana generalizada.

Tensão de Membrana Localizada – o foco está na região de descontinuidades “Gross Structural Descontinuites”, desprezando concentradores de tensão. Tensões devido a forças mecânicas.

Figura 8 - Tensões de membrana localizada.

Tensão de Membrana Localizada + Flexão  –  o foco está nas regiões longe a descontinuidades considerando a parcela de flexão, ocasionadas por forças mecânicas.

Figura 9 – Tensões de membrana localizada + flexão.

Tensões Secundárias:

A principal característica das tensões secundárias é de ser “self-limiting”, ou seja, caso as tensões secundárias excedam o limite de escoamento existirá uma redistribuição de tensão, e a falha não existirá.

As tensões secundárias podem ser ocasionadas por forças mecânicas e reações devido a expansão térmica.

São desenvolvidas por descontinuidades, entretanto, concentrações de tensão localizadas são desprezadas. Exemplos da tensão secundária são tensões térmicas e tensão de flexão em descontinuidades “Gross Structural Discontinuity”.

Figura 10 - Tensões secundárias (membrana + flexão) - próximo a união do bocal.

Tensões de Pico:

As tensões de pico são as tensões adicionais existentes em regiões bem localizadas, sendo importantes para a análise de fadiga.

Caso as tensões de pico excedam o limite de escoamento existirá uma redistribuição de tensão, e a falha não existirá.

As tensões de pico são fontes de iniciação de trincas de fadiga, e alguns exemplos são citados abaixo:

  • Tensões nos cantos de descontinuidade “Local Structural Discontinuity”;
  • Tensões térmicas em paredes ocasionadas por uma mudança abrupta de temperatura;
  • Tensões térmicas em revestimentos ou sobreposição de solda;
  • Tensões devido ao efeito de entalhe;

Ainda tem dúvida de como categorizar as tensões provenientes dos resultados obtidos na sua análise. Acesse 2 tabelas extremamentes úteis da ASME que vai te auxiliar:

  • Tabela 5.1 “Stress Categories and Limits of Equivalent Stress” – essa tabela mostra a relação entre as categorias de tensão (primária, secundária e pico), com as tensões admissíveis aplicadas a cada uma.
  • Tabela 5.6 “Examples of Stress Classification” – essa tabela contém vários exemplos de como as tensões devem ser caracterizadas com base na localização da tensão. Exemplo – como caracterizar as tensões na região de bocais, e assim por diante.

Conseguiu entender o conceito de análise de tensões de acordo com a ASME? Segue um resumo abaixo:

As tensões primárias são aquelas que se distribuem por uma grande parte da estrutura e estão ligadas ao modo de falha de colapso plástico. Dessa maneira essas tensões não podem em nenhuma situação ultrapassar o limite de escoamento. Apenas as cargas mecânicas são consideradas nessa categoria de tensão.

As tensões secundárias são localizadas, desprezando as concentrações de tensão, e caso ultrapassem o limite de escoamento, as deformações plásticas tendem a se estabilizar pois são auto limitadoras. Dessa maneira o limite das tensões secundários é superior ao das tensões primárias. As tensões térmicas são consideradas nessa categoria de tensão.

As tensões de pico são aquelas que consideram as descontinuidades e concentradores de tensão, levando em consideração cargas mecânicas e térmicas. As tensões dessa categoria estão relacionadas ao modo de falha de fadiga.

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